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Por Antonio M. Moreiras
Gerente de Projetos e Desenvolvimento no NIC.br

Um marco histórico para o governo e para a Internet no Brasil

Neste final de semana, em um movimento silencioso, o site www.gov.br passou a responder em IPv6. Pode parecer apenas um detalhe técnico, mas para quem acompanha a evolução da infraestrutura da Internet, trata-se de um marco histórico. É o governo federal brasileiro dando um passo concreto em direção à Internet do futuro, uma Internet mais direta, eficiente e sustentável.


IPv6 ativado no gov.br

IPv6 ativado no gov.br

A ativação do IPv6 no domínio central do governo simboliza algo maior do que uma simples mudança de protocolo. Representa maturidade técnica e visão estratégica. Mostra que o Estado brasileiro começa a alinhar sua infraestrutura digital com o que há de mais moderno na rede global. É também um gesto de liderança e responsabilidade, já que o governo, ao adotar o IPv6, dá o exemplo para órgãos públicos, empresas e provedores que ainda não completaram sua transição.

Esse resultado é fruto de um trabalho bem executado e coordenado por equipes do SERPRO e do Ministério da Gestão e Inovação (MGI), que vêm atuando há anos para modernizar os serviços digitais do governo. A decisão de colocar o gov.br em IPv6 é, portanto, ao mesmo tempo técnica e simbólica: marca o início de uma nova fase da Internet pública no Brasil, uma fase em que a conectividade do Estado se alinha à conectividade da sociedade.

O que o IPv6 muda para o governo e para o cidadão

A adoção do IPv6 no gov.br vai muito além de um avanço técnico: representa uma melhoria concreta na qualidade e na segurança dos serviços digitais oferecidos pelo governo. Ao substituir conexões indiretas baseadas em tradução de endereços (NAT) por comunicações fim a fim, o IPv6 aproxima o cidadão dos serviços públicos. Isso significa conexões mais diretas, rápidas e estáveis, sem a perda de desempenho ou falhas de compatibilidade que ainda afetam muitos sistemas sob IPv4. Em termos práticos, aos poucos vamos construir uma Internet que “funciona melhor” para quem usa serviços como o Gov.br, Meu INSS, Receita Federal ou e-SUS.

Do ponto de vista da administração pública, o impacto é ainda maior. O IPv6 permite que todos os dispositivos da infraestrutura governamental, como servidores, equipamentos de rede, sistemas de autenticação, etc, possuam endereços globais exclusivos, o que melhora radicalmente a rastreabilidade e a capacidade de resposta a incidentes. Em vez de um ambiente fragmentado e mascarado por NATs, o governo passa a operar com visibilidade total da sua própria rede, facilitando a identificação de dispositivos comprometidos e o tratamento de ameaças cibernéticas.

Além disso, a nova arquitetura traz maior resiliência frente a ataques DDoS, permitindo que as defesas sejam distribuídas e gerenciadas de forma mais granular. Essa característica é particularmente relevante em um cenário onde o número de ataques de negação de serviço a órgãos públicos cresce ano após ano. O IPv6, ao simplificar o roteamento e eliminar intermediários desnecessários, torna essas redes mais previsíveis, mais controláveis e mais seguras.

Para o cidadão, o resultado é direto: melhor experiência e mais segurança. Para o Estado, é eficiência, governança técnica e autonomia operacional. E para ambos, é a consolidação de uma Internet pública mais moderna, transparente e robusta! Exatamente o que se espera de uma infraestrutura digital que suporte o futuro do Brasil.

Por que o IPv6 é essencial para o futuro da Internet

O IPv6 é o alicerce técnico que garante a continuidade da Internet como a conhecemos. O antigo IPv4, criado em 1981, dispõe de cerca de 4,3 bilhões de endereços, um número que a humanidade esgotou há mais de uma década. Desde então, a rede tem sobrevivido com remendos: o uso intensivo de NATs, múltiplas camadas de tradução e artifícios que aumentam a complexidade, reduzem o desempenho e dificultam a segurança. O IPv6 nasce justamente para resolver isso, oferecendo trilhões de trilhões de endereços e uma arquitetura mais simples, eficiente e direta.

Mas o IPv6 não é apenas uma resposta ao esgotamento de endereços. Ele é a base de uma Internet mais moderna, preparada para sustentar a universalização da Internet, o acesso significativo, e o crescimento de novidades como IoT, de redes domésticas inteligentes, da computação em nuvem, da IA e de tudo o que exige conectividade em larga escala. Em um mundo onde cada carro, medidor, câmera ou sensor precisa se comunicar com segurança, o IPv6 é o que garante que essa comunicação continue sendo possível e feita da maneira certa: de forma fim a fim, sem intermediários e sem perda de desempenho.

O Brasil, nesse contexto, está entre os países mais avançados do mundo. Segundo o Google, 52,28% dos usuários brasileiros já acessam seus serviços via IPv6. O APNIC mostra um índice de 51,78% de tráfego IPv6 no país. Dados da Cisco 6Lab apontam para mais de 55% de implantação, e a Akamai confirma que mais da metade do tráfego nacional já ocorre em IPv6. Esses números colocam o Brasil à frente da média global e à frente de muitos países desenvolvidos.

Esse avanço não é apenas estatístico, ele reflete a maturidade técnica e o comprometimento de todo o ecossistema brasileiro de Internet: operadoras, provedores, universidades, órgãos públicos e entidades como o NIC.br, que há quase duas décadas trabalham para preparar o país para esse momento. É o resultado de uma construção coletiva que garante ao Brasil uma posição de protagonismo na Internet do futuro.

Um resultado de décadas de preparação técnica

A implantação do IPv6 no Brasil não veio do nada. Em boa medida, ela é fruto de uma construção paciente e coordenada que começou há quase vinte anos, quando o NIC.br, sob orientação do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), criou a iniciativa IPv6.br. Desde 2008, a entidade vem atuando para preparar o país técnica e institucionalmente para a transição. A estratégia sempre foi clara: formar pessoas, difundir conhecimento, oferecer suporte técnico e articular os diversos atores da Internet brasileira: provedores, empresas, universidades, governo e fabricantes.

Ao longo desse período, foram mais de 10.000 profissionais treinados em cursos presenciais e a distância. De 2009 a 2017, o NIC.br realizou 202 turmas presenciais, incluindo três turmas exclusivas para o SERPRO, que capacitaram 98 servidores públicos em Brasília entre 2010 e 2011. A partir de 2017, o curso IPv6 Básico passou a ser oferecido em formato EaD na plataforma edX, atingindo mais de 17.000 matrículas até hoje. Além disso, o NIC.br publicou o livro “Laboratório IPv6”, distribuído gratuitamente a 231 universidades, e criou o Guia de Compras IPv6, ajudando instituições públicas e privadas a exigir suporte ao protocolo em seus processos de aquisição de equipamentos e serviços.

Essas ações foram complementadas por uma intensa atuação de articulação institucional. O projeto IPv6.br organizou Fóruns de Implementadores IPv6, Cafés da Manhã Técnicos e reuniões com operadoras, bancos, provedores, fabricantes e o setor público, que resultaram em resoluções do CGI.br e na criação do GT-IPv6 da Anatel. Foi esse trabalho que pavimentou a transição das grandes operadoras brasileiras, que hoje operam com IPv6, e criou o ambiente favorável para que o governo federal pudesse, com segurança, dar o passo que deu agora.

O IPv6.br não apenas disseminou conhecimento técnico: ele formou uma cultura de sistemas autônomos e de troca de tráfego, contribuiu para o fortalecimento dos IX.br, e inspirou uma nova geração de engenheiros e gestores públicos a compreender a Internet em sua profundidade. É por isso que, quando o gov.br passa a responder em IPv6, ele o faz sobre uma base sólida, construída por anos de aprendizado, colaboração e comprometimento coletivo.

O que vem a seguir e o impacto para o Brasil

A ativação do IPv6 no gov.br tem o potencial de ser muito mais do que uma atualização tecnológica: podemos estar vivendo um ponto de inflexão na história da Internet brasileira. Ela representa o início de uma nova fase, em que o governo federal assume papel de protagonista na modernização da infraestrutura digital do país. E quando o Estado lidera pelo exemplo de um trabalho bem feito, os efeitos se espalham rapidamente. Governos estaduais, prefeituras e outros setores que ainda não completaram sua transição, como o bancário e o de comércio eletrônico, certamente serão motivados a acelerar seus projetos de implantação.

Esse movimento também tende a impulsionar a adoção do IPv6 dentro da própria administração pública. A partir de agora, é natural que o protocolo se torne padrão nas redes internas, nos sistemas e nos serviços digitais do governo, promovendo integração entre órgãos, interoperabilidade entre plataformas e uma gestão mais segura e eficiente da infraestrutura. Essa transformação não é apenas técnica; é estratégica. Ela fortalece a resiliência, a transparência e a autonomia tecnológica do Estado brasileiro.

No plano mais amplo, a medida reforça o papel do Brasil como referência mundial na implantação de IPv6. Poucos países alcançaram índices tão elevados de adoção e menos ainda o fizeram com base em um modelo de governança multissetorial, colaborativo e técnico como o nosso, construído em torno do Comitê Gestor da Internet no Brasil. Isso mostra que o país tem capacidade de liderar debates e ações concretas sobre o futuro da Internet, equilibrando inovação, inclusão e soberania.

O gov.br em IPv6 é, portanto, um grande marco. Um marco que não apenas celebra o sucesso de um projeto de longo prazo, mas aponta para o futuro de uma Internet mais aberta, eficiente e segura, construída coletivamente, com conhecimento técnico e visão pública. Um passo firme, e simbólico, de que o Brasil está preparado para o que vem pela frente.

Parabéns ao Governo do Brasil. Parabéns ao Serpro.

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